terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Uma terça trabalhosa


Já cheguei, há muito tempo, à conclusão de que quando não estou no meu local de trabalho, o dia é muito mais trabalhoso. Não sei se é pelo fato de trabalhar dentro de uma rotina simples, sou arquivista, ou se é por que lá não são questões da minha vida pessoal que estou desenvolvendo.

Hoje foi um dia daqueles, por que fui fazer a matrícula do meu filhão no Colégio Pedro II. Ele foi admitido para o 1º ano do Ensino Médio. Eu e a burocracia parecemos sempre querer achar um pé de briga, mas tenho procurado conter-me e ser paciente.

Penso como teriam sido as vidas de Florbela Espanca e Camille Claudel se tivessem sido mães. Ser mãe é algo que salva a gente desse mundo cão.


RECORDO O MAR (Pablo Neruda – in CANTO GERAL)

Chileno, tens ido ao mar neste tempo?
Vai em meu nome, molha tuas mãos e levanta-as
e eu de outras terras adorarei essas gotas
que caem da água infinita em teu rosto.

Eu conheço, vivi toda a minha costa,
o grosso mar do Norte, dos paramos, até
o peso tempestuoso da espuma nas ilhas.

Recordo o mar, as costas gretadas e férreas
de coquimbo, as águas altaneiras de Tralca,
as solitárias ondas do sul, que me criaram.

Recordo em Puerto Montt e nas ilhas, à norte,
ao voltar pela praia, a embarcação que espera,
e nossos pés deixavam em suas marcas o fogo,
as chamas misteriosas de um deus fosforescente.

Cada pisada era um regueiro de fósforo.
Íamos escrevendo com estrelas a terra.
E no mar resvalando a barca sacudia
uma ramagem de fogo marinho, de vagalumes,
uma onda inumerável de olhos que despertavam
uma vez e tornavam a dormir em seu abismo.

Ao que me parece do pouco que conheço dele, Pablo Neruda devia ter um sentimento de amor enorme por seu povo e por seu país. Mesmo sabendo-o alienado. Fico pensando se, vivendo nos dias de hoje, ele seria capaz desse sentimento. Por que será que ele amava tanto o seu povo? Teria sido por ser ele comunista? Comunistas são aqueles movidos por grandes sentimentos de amor pela humanidade. Isso nada tem a ver com a filiação partidária.

De certa forma ou em certa medida, os "fracos e oprimidos" costumam despertar esses sentimentos em pessoas esclarecidas. Eu também já me senti assim, tanto que tive um longo período de militância político-partidária e comunitaria em minha vida. Hoje, não mais!
Pergunto o que há de errado: serei eu? será o mundo? serão os "fracos e oprimidos"? Quem são esses necessitados de liderança hoje?

Já acreditei que o povo, desprovido de condições e instrução para defender-se dos exploradores e usurpadores precisava, sim, de liderança para encaminhar a sua vida e evolução, com liberdade e autonomia sobre seus destinos e quereres. Mas, findas algumas ameaças, modificado o modo de vida global, o que fizeram e fazem estas pessoas com as poucas liberdades conquistadas e o caminho aberto, muitas vezes com sangue?

Vejo-as buscando brechas nos projetos de dominação e roubo para colherem o seu próprio quinhão, ou arrumarem bengala. Não as vejo querendo evoluir. Não são mais coitados. Claro, estou falando de modo geral, mas Neruda lembra-me a luta maior.

Brilhante Pablo Neruda!

Artigo, ou carta.

Segundo o dicionário escolar da língua portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, edição de 2008, civilização é um “ conjunto de características próprios à vida intelectual, artística, moral e material de um país ou de uma sociedade. P.311”

Pois bem, partindo daí, lamento o fato de que no momento resido numa localidade que não pode ser enquadrada nesta definição: o Porto Velho em São Gonçalo é um lugar onde não há coleta regular de lixo, fornecimento adequado de água e esgoto, nem de energia elétrica. Internet decente, nem pensar!

Recentemente foi proposta na Câmara Municipal, e prontamente rejeitada, uma emenda ao orçamento para dar-se início à implementação de um projeto de legalização fundiária e urbanização de uma comunidade com cerca de 400 residências, cujo projeto, muito competentemente elaborado pelo NEPHU/UFF, sob orientação e coordenação da professora Regina Bernstein, está pronto há mais de um ano. A busca por legalidade visa, entre outras coisas, prevenir a criação de novas “faixas de gaza” no Estado, bem como alavancar o progresso material e intelectual de gerações.

Neste momento, 8/2/09 às 22h, escrevo à luz de velas, pois só há tecnologia e estrutura na civilização, portanto fora de onde me encontro, mas não posso conter um péssimo hábito que adquiri: pensar. E o que em mim pensa, escreve.